sábado, 8 de agosto de 2009

Sinfonia do Silêncio Nocturno



Resvala sobre mim uma noite iluminada, calma e silenciosa, não triste mas nostálgica. Paira no ar o som do silêncio que me embala num sono que não tarda em chegar. O relógio marca 5 minutos de tardar 2 horas da madrugada e eu sou inspirada pelo reflexo da Lua cheia no mar e pelo meu próprio reflexo esbatido nas estrelas que me tocam e me levam a viajar (quase sem sair do meu lugar), por nuvens e esboços traçados, num papel branco, a tinta, suave, azul.
O cheirinho a maresia inunda-me o espírito, conforta-me a alma e quase me leva a naufragar do longe que está que eu teimo e tento e não consigo lá chegar...

Deixo, de repente, de pensar no mundo. Deixo de pensar nos meus próprios pensamentos. Deixo de pensar na simetria e na assimetria das coisas e foco-me apenas nesta noite, no aqui e no agora. Amanha tudo é vago e incerto e o tempo não me prende para pensar nisso.
Estou num momento em que me cansa quase tudo. Cansa-me pensar, cansa-me dormir, cansa-me acordar...Cansa-me a simples ideia de cansaço e sobretudo cansa-me cansar-me. Não entendo porquê tanto cansaço se nada do que faço ou penso é assim tão cansativo..Quase que estou perdida em tudo aquilo que sou e no cansaço do que fui e da ideia daquilo que pretendo ser e que ainda não sei o que será.

Pudesse, nesta noite, a sinfonia deste silêncio inspirar-me, trazer-me tudo aquilo que me falta e completar-me como outrora já me senti....

As palavras fogem-me tal como os meus dias, que lentos, urgem rapidamente de mim, dando origem a noites singelas mas sentidas como esta em que digo Adeus ao desejo que me fica(ficou) de ir atrás de ti, de um tempo bem investido, correr universo fora, perder estrelas, constelações, quem sabe até Planetas e levar-me contigo....

É estranho sentir, ao contemplar o horizonte incerto, nos meus olhos, uma expressão de nostalgia que me leva a viajar ao passado - relembrando-me de tudo o que findou, de tudo aquilo que ficou e de toda a nostalgia que sinto ao pensar em todos aqueles que comigo se cruzaram – visualizar o presente com a ternura que cabe ao dia de hoje que ainda há pouco se finou e imaginar cegamente o que o “amanhã” me trará. Ao fazer esta “viagem” apercebo-me de que escorrem em mim, suavemente, quentes e salgadas, lágrimas, provenientes talvez de tristeza, talvez de nostalgia, talvez de amargura ou desalento, talvez de ódio ou quem sabe de outro, qualquer, sentimento. Ou quem sabe talvez de coisa alguma, talvez sejam provenientes apenas da contemplação do horizonte longínquo ou apenas da noite paisagística que me assolou…

Ah pudesse o relógio levar-me para longe do tempo, roubar-me o infinito, trazer-me alento à madrugada…Pudesse a sinfonia do silêncio inspirar-me, trazer-me tudo aquilo que me falta e completar-me como outrora já me senti…

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

ABSURDO




Tornarmo-nos esfinges, ainda que falsas, até chegarmos ao ponto de já não sabermos quem somos. Porque, de resto, nós o que somos é esfinges falsas e não sabemos o que somos realmente. O único modo de estarmos de acordo com a vida é estarmos em desacordo com nós próprios. O absurdo é o divino.




Estabelecer teorias, pensando-as paciente e honestamente, só para depois agirmos contra elas - agirmos e justificar as nossas acções com teorias que as condenam. Talhar um caminho na vida, e em seguida agir contrariamente a seguir por esse caminho. Ter todos os gestos e todas as atitudes de qualquer coisa que nem somos, nem pretendemos ser, nem pretendemos ser tomados como sendo.

Comprar livros para não os ler;
ir a concertos nem para ouvir a música nem para ver quem lá está;
dar longos passeios por estar farto de andar e ir passar dias no campo só porque o campo nos aborrece.



Livro do Desassossego (Fernando Pessoa)