terça-feira, 16 de agosto de 2011

Os Meus Pedaços de Outrém



Ouve-me, ouve o meu silêncio. O que digo nunca é o que digo e sim outra coisa, capta essa outra coisa que na verdade digo pois eu mesma não posso. E deixa-me ouvir o que não ouço (…) que é qualquer coisa que não posso ouvir senão em segredo e que talvez não seja nada, porque o silêncio não tem fisionomia mas as palavras muitas faces.
Mergulho na multidão para afogar o grito do meu próprio silêncio, pois o único silêncio que perturba é aquele que fala – apesar de que – mais vale um silêncio certo, que uma palavra errada, num mundo onde qualquer um pode zangar-se – isso é fácil, pois o difícil é zangar-se com a pessoa certa, no momento certo, na justa medida, pela razão certa e da maneira certa. É com o coração que vemos claramente; o que é essencial é invisível aos olhos.

De quem é o olhar que espreita pelos meus olhos? Quando penso que vejo, quem continua a ver enquanto estou a pensar? Por que caminhos seguem, não os meus tristes passos, mas a realidade de eu ter passos comigo? Não. Não digas nada. Supor que o dirás, a tua boca velada é ouvi-lo já. É ouvi-lo melhor do que o dirás. O que sou não vem á flor das frases e dos dias. Eu sou melhor que Eu. Não quero dizer nada, quero Ser. Cansa sentir quando se pensa.

Enquanto o silêncio arquitectava planos não compartilhados, ele tinha momentos ocasionais de silêncio que tornavam a sua conversa um verdadeiro prazer, mas quando nada é dito, nada fica combinado. O tempo que perdemos pela vida a correr, o tempo que perdemos a sonhar que é chegar e vencer, ele nunca quis saber, nunca quis acreditar, que eu iria partir, não podia cá ficar. Nunca quis escutar, muito menos quis ouvir, o meu silêncio que avisava a intenção de não voltar. Voei pra lhe dizer, sonhei pra o esquecer, pois eu sei que ele não vai parar pra eu crescer. Eu sei, esperei demais. Seus lábios diziam que amava, e o seu olhar, inacessível por detrás da visão e do que se deixa ver, dizia que de ódio se tratava. O amor foi começado, mas o ideal não acabou, quem o tenha alcançado, não saberá o que alcançou. Temos de nos perder, para nos encontrar.

Contemplo o que não vejo, pois o que me dói não é o que há no coração, mas sim essas coisas lindas que nunca existirão… são formas sem forma que passam sem que a dor as possa conhecer ou o amor as possa sonhar ou ver, e de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos julgando ser donos das coisas, dos instantes, e dos outros. E comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas a ilusão de que tudo podia ser meu para sempre, e esta verdade? -Não pertence a ninguém, mas tão somente a quem seja capaz de a entender, pois a verdade mora no silêncio que existe em volta das palavras, onde não há a sedução da clareza nem os enganos do óbvio.
A vida é uma comédia para aqueles que pensam e uma tragédia para aqueles que sentem, ‘dá-me’ um homem que não seja escravo das suas paixões, e eu trá-lo-ei no coração do meu coração. Há muitos barcos para muitos portos, mas nenhum para a vida não doer, nem há desembarques onde se esqueça aquilo que se quer esquecer.

Nos confins do silêncio encontrarei o meu espaço, e passo a passo nele fundarei o meu lugar, onde tudo terá o seu certo valor, até mesmo o vazio interior que brota no silêncio da tristeza de um amor iludido e não correspondido. Pois eu aprendi o silêncio com os faladores, a tolerância com os intolerantes, a bondade com os maldosos; e por estranho que pareça estou grata a esses professores.O tempo é um momento para nunca mais, o tempo mesmo agora fez a terra girar e sem demora traz as ondas do mar. O tempo que se inventa quando nunca se é capaz, o tempo é um carro novo sem marcha-atrás. E a morte chegará cedo, pois breve é toda a vida, o instante é o arremedo de uma coisa perdida.

Os meus Pedaços de Outrem:
“O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.”

Texto construído por: Ana Rita Cunha (losT)
P.S: Obrigado por me autorizares a sua publicação =)

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